sábado, 14 de julho de 2007

Governemos (?!) a Universidade como se «isso» fosse uma Empresa


Não passaram ainda muitos anos desde que um amigo meu – finalmente – conseguiu a combinação de números ideal que, conjugada com as duas estrelas certas, lhe deu direito a quadro pintado a óleo no salão nobre da reitoria. Uma vez que qualquer um de nós dois, havia feito em ocasiões de colectividade e noutras de singularidade, números de circo muito engraçados, sob a égide da Sonae e que nos conhecíamos razoavelmente das trocas e baldrocas de facturas e recibos, natural seria que entre um copo e uma água, conversássemos sobre a hipótese de dirigir a universidade tal qual se dirige uma empresa (o inverso é insano, inverosímil, improvável, impossível…).

Várias são as piadas mais ou menos fumígenas que animaram os nossos pudicos copos, uma das quais pode perfeitamente ser partilhada por um circuito tão pequeno como aquele que anima esta network:
«Imaginemos que o Cardeal, actual administrador da TVI, consegue a maioria dos curadores de uma das fundações que por aí vão nascer – vêm a pé, mas acabarão por chegar – obviamente, a generalidade dos professores e demais guardadores do céu dirá que o ‘show business’ nada tem a ver com o seu mundo. Será?»

Recentemente, uma universidade aí
do meio do ranking , daquelas que estão algures entre Viana do Castelo e Sagres, convidou alguns craques da indústria para professores catedráticos da sua malha, na qualidade de profs convidados claro e com custo zero. Mas quê? Ninguém lhes pediu nada foi? O negócio .., ah! Carago não era negócio que eu queria dizer.
Toda a gente vai resistir ao cerco, especialmente quem for virgem, mas inexoravelmente, chegará um tempo em que as entidades da educação superior estarão no bufete das chamadas forças do mercado. Com a tendência para o agravamento da dependência financeira pela qual passam todos – quanto maior é a factura maior é o tombo – será que não se perfila já, uma universidade para a frente ribeirinha do Tagus? (Auguri J.M.Judice… Felicitazioni per la tua nominación... so.. che... Hai lavorato duramente ... ma che vuoi ora che ti chiami Dottore oppure Commendatore?!)

Há coisas que são por demais do tipo 2+2, como na área da indústria farmacêutica e da biotecnologia, em que as alianças realizadas com as universidades geram acordos em que os resultados da investigação são trocados por equipamentos analíticos ou servidores ou por graduação de assistentes ou por benefícios seráficos junto da supervisão do departamento, como por exemplo «um cartão GALP» ou dois, ou três.
Este tipo de arranjos, dito assim por um mercenário como eu, trazem benefícios óbvios no curto prazo; agora falemos alto e com claridade: o resultado a longo prazo é que os programas de investigação (orientada) tendem ou são mesmo dominados pela agenda comercial do outro laboratório da rua ao lado.

O próximo problema emergente, ainda debaixo dos panos, será o das futuras escolas “for-profit”, se é que elas já não andam por aí. E podem continuar sentados, por favor não se levantem, nem soltem frases do tipo: - Ai que horror!
A discussão deixa de ser em torno da Universidade Golden Triangle situada no lado norte da Highway 237 só porque ela era uma escola pública (?!), é que, só quem for empresarialmente louco é que pega numa universidade privada. Aquilo é para totós e betinhos feitos à moda e ao tempo da outra madonna.
A chicha da perna está aí, na nata da educação superior pública.
Começa porque elas chegam ao bufete, higienicamente saneadas sob o ponto de vista financeiro. Depois a cena prossegue, porque elas não têm concorrência, pese embora duas delas serem da classe ‘business school’, mas com algum jeito aquilo entre alinhamento e reorientação dá para todos. A terceira é uma tecnológica com trabalho prospectivo já feito para ‘upgrade’ futuro. Que estimativa se avança, só para a cidade grande, em termos de fluxo de alunos orientados para escolas ‘for-profit’? 60.000? 100.000 estudantes?
Porque diabo, querida amiga RN, se iriam os politécnicos imiscuir num negócio, que não é de chinelos (pode ser é de chineses, como aqueles da OPA) e que se está mesmo a ver que não foi feito para eles? Esqueça! Esqueça essa treta de Fundações para politécnicos e qualquer outra coisa que não seja ‘mission-research oriented’. Estamos entendidos?
Seria naïve demais (eu), para supor que uma Universidade, por exemplo o Porto, possa ser imune às pressões económicas como as que andam a rabiar e mexer por aí. Visto de uma perspectiva, a U.P. tem um produto para vender (as suas graduações), uma base bem-definida de clientes potenciais, e um programa de marketing (suavemente) controlado para tornar o produto atractivo. Em abstracto, parece natural que a U.P., por exemplo, esteja a funcionar numa maneira tal que maximize a eficácia na venda do seu produto específico. Na prática, isto pode significar um funcionamento da universidade como um negócio de concessão de graduações.

Afastemos o Porto e passemos a generalizar, à cautela, antes que me risquem o carro…

Façamos de conta que a maioria dos quadros superiores da universidade pública, (não me venham com classificações corporativas, PF), possuem um background ou no mínimo um polimento em torno das ideias básicas de gestão – ler o Expresso durante vinte anos seguidos também ajuda – e que, com alguma lógica, a equipa de curadores tenda a ser dominada por executivos do mundo dos negócios. Interrompo aqui, para lembrar aquele curso que vem aí, liderado pelo Mira Amaral, e que não tem nada a ver com isto de que estamos aqui a falar…
Retomemos o fio à meada; o resultado líquido é que uma parcela significativa das pessoas responsáveis pelo ajustamento (alinhamento) da política da universidade pensa e age como militantes executivos. Isto pode ingenuamente ser adicionado às forças externas que agem e trabalham no duro para transformar a universidade pública numa empresa que faz negócios e que está longe de ser ninho para patos bravos.

Tranquilizem-se! Há pouca probabilidade, naturalmente, de que a universidade irá ter um grau de sofisticação nas suas operações que lhe permita realizar lucros rapidamente. Isto dava cabo do seu status remotamente conectado com impostos e outras invenções do demo. É mais provável que possa vir a ser controlada exclusivamente à boa maneira dos negócios bem feitos, que não dão barulho nem fazem muitas ondas. Óbvio, isto vai chegar até, entre outras coisas, ao tratamento dos seus estudantes como clientes, das suas faculdades como empregados, e dos seus administradores como responsáveis, finalmente, pelo respectivo bem-estar institucional.

Há indubitavelmente, muitos elementos da universidade (estou a olhar para as faculdades da U.P., outra vez – trabalhei lá 12 anos e isso não é de borla) que sentem ter ido o MCTES longe demais no traçado deste trajecto. Outros podem diferir. Aliás, olhando para o mapa vemos as camisolas cada vez mais matizadas e algumas até manchadas aqui e ali por pintarolas e outras bolas, mas todos os grupos de interessados devem concordar que o tempo é assim e muita malta com os 50 já cumpridos não saberá em que se ocupar até aos 65 do R.D.M. pelo que, é saudável o envolvimento numa discussão detalhada sobre a extensão do modelo de gestão que possa ser compatível com a nossa missão educacional. O ponto a ser debatido não é se nós necessitamos de áreas administrativas eficientemente controladas e se vamos ou não aguentar os custos. Sem sombra de dúvida, nós também temos que fazer isso. A pergunta certa, no dia de hoje, é se, para objectivos do planeamento a longo prazo e das operações do dia-a-dia, a universidade deve ser concebida e desenvolvida como uma organização que proporciona e disponibiliza (fornece) um produto a um grupo selecto de consumidores.

1 comentário:

Regina Nabais disse...

Respondendo à sua última pergunta, Alexandre, a única que para mim, é verdadeiramente pertinente, nos últimos tempos, em Portugal.
Seria SIM!
As universidades deveriam, quanto a mim, efectivamente ser regiamente bem pagas, para prestação de serviços exclusivos (inclusivamente EDUCAÇÃO E INVESTIGAÇÃO) mas para clientes MUITO SELECTIVOS - EDUCANDOS E EMPRESAS. Por isso mesmo,deveriam trabalhar com poucos clientes e com poucos serviços, mas altamente sofisticados. Por outro lado, deveriam evitar converterem-se em "drogarias" de banda larga, que "vendem de tudo" um pouco, do sabão azul, à inovação de motores Rolls Royce.