segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Inovando em estratégias de inovação



O novo ministro de Ciência & Tecnologia, dono da Agência de Inovação e patrão de um Secretário de Estado que por sua vez é patrão dele noutra instituição do Estado (e não é peta), tem os telejornais à perna. Como conseguirá safar-se e fazer tudo o que disse que havia para fazer? E se aparecem por aí novas ideias?

Aqui há uns dias atrás vi-o por Faro. Inaugurava um dos maiores congressos que se celebram na Europa, INOVECO 2007, a que acudiram mais de 13.000 tecnólogos de todo o mundo (de 86 países, para ser preciso), a maioria dos quais, com a ideia fixa de ir tomar banho ao mar. Nesse acto, ele não era a estrela principal. Repartia o protagonismo com a Presidente da Região AllGarb, Mariana Fria, com o cónego Bento Forte (‘chairman’ local do evento) e com Milado, o afamado cozinheiro de Cascais, Estoril e outras praças e pistas. A seu lado, José Montado, reitor da Universidade Marítima, dava-lhe toques com o cotovelo, chamando-lhe a atenção para celebridades do doce algarvio. Ninguém resiste aos Dom Rodrigo, morgados, morgadinhos, figos cheios, queijos de figo, figos com amêndoa e chocolate, pastéis de batata-doce de Aljezur e tantos outros, O Ministro, «mau político» mas com certeza um bom Ministro, teve de fazer bicha entre tanta personalidade para poder contar algo que tivesse um mínimo de conteúdo.

A verdade é que o «número» não lhe saiu muito bem. Ou ao contrário, depende da cor e lentes dos óculos. Não disse nada de relevante salvo o esperado «obrigado pelo convite, isto [o congresso] é muito importante e gostava que soubessem que no Ministério, não só fazemos coisas como também vamos fazer coisas». Pouco mais ou menos o mesmo que disseram o resto dos convidados. É o mal dos actos protocolares, que só merecem a pena pela foto de família. Raramente se soltam conteúdos.

E o caso é que valia a pena porque, desta vez, o enfoque não se reduziu a novas agências, novos regulamentos ou novos projectos com o MIT. Também se falou, e muito, da envolvente familiar, do social, de como afecta um jovem estudante Erasmus o facto de existiram aulas da parte da manhã e das muitas pessoas que o rodeiam se for assistir a um seminário do senhor Prof. Secretário de Estado. Por sorte, após as apresentações oficiais veio o Moscatel, o Lagoa de Honra, mais o Bacalhoa e assim se foram soltando um pouco mais, os convidados.

Graças a isso soubemos que José Montado havia superado um pedido de demissão e que a Fundação Alice no País das Maravilhas, (a tal de Bento Forte), já leva tempo investindo em fórmulas culinárias especialmente pensadas para estudantes do 3.º ciclo de Bologna, e mais recentemente para detentores de pós-doutoramento sem emprego, e que o Ministro tem intenção, nos poucos telejornais que o nosso Primeiro lhe deixar até às próximas eleições, de executar algo parecido com uma estratégia nacional contra o chumbo. Estamos seguros de que não chegou a detalhar como o faria nem com que instrumentos. Tampouco disse uma só palavra sobre orçamentos.

Visto aquilo que foi visto e como sou espírito positivo, acreditando que tem algo de serventia, ocorre várias coisas que pelo melhor lado poderiam ter interesse. Conste que as ideias não são minhas (isso os meus amigos já sabem), são certamente de pessoas que sabem muito mais. Eu limito-me a recolher as ditas e expô-las dentro de uma certa ordem.

Começo pela iniciativa de Milado. Aqui há uns meses atrás publicou um livro do qual apenas se fez difusão, livro este em que ele, em colaboração com outros cozinheiros, dietistas e nutricionistas, jogava com as texturas dos alimentos para dar forma a receitas de fácil preparação, apetecíveis e adequadas a estudantes sem bolsa e assistentes sem contrato. Ainda que pudesse parecer, não é nenhuma idiotice e muito menos um exercício de oportunismo.

Merece a pena recordar que são muitos os assistentes que recebem auxilio psicológico e apoio moral para suportar os efeitos adversos da política de investigação que lhes faculta mais resignação que recursos. Entre eles estão a perda de apetite, a dificuldade para deglutir e ainda digestões complicadas. As dietas recomendam-se para combater estes e outros efeitos que nem sempre são bem aceites pelos pacientes assistentes. Entre outras razões, porque mais que uma dieta amiúde são uma tortura. Desenhar um prato de conteúdo hiperproteico que não só não seja um castigo mas também que seja convidativo a comer tem o seu mérito.

Que tem isto que ver com uma estratégia? Pois por ter estado a ouvir tudo quanto se disse na INOVECO 2007, muito. No congresso falou-se de stress postraumático em adolescentes cujos pais haviam padecido ou gostavam de ter padecido do mesmo problema. De divórcios quando um dos membros do casal é dependente de uma instituição pública (parece que aumenta o índice de separações) ou da carga emocional que suportam os equiparados a funcionários do Estado, muitos deles acidentais.

Dando uma olhadela aos centros dos serviços de assistência primária ou aos grandes hospitais de referência (os dois extremos do sistema nacional de saúde) veremos que estas questões se resolvem, no melhor dos casos, com boa vontade. Todo o mundo admite que se trata de aspectos a cuidar, porém não há recursos nem meios nem pessoas. O posto de psicólogo-cívico apenas está coberto superficialmente. E cobrir esta falha continua a ser uma novidade daquelas de que se poderia falar, incluso nos jornais e nos blogues dos jornais.

Há mais coisas. Por exemplo: quando se ensaia um novo fármaco (este é um dos efeitos da globalização) formam-se redes e plataformas de colaboração que conectam hospitais (o mais adequado seriam serviços hospitalares) de diversos países. Para assistência à educação superior Portugal continua a ser uma lamentável excepção. Salvo contadas excelências (por sorte de alto nível), a participação das unidades de investigação farmacológicas e médicas com este novo projecto anunciado para o Norte que nos vai inserir mais à Galiza nestas redes internacionais afasta-nos do anedótico estatístico. Bom seria inverter esta situação replicando por todo esse imenso Portugal esta história da marca "Saúde Portugal" com a Bial + IPATIMUP, o IBMC e o INEB + UP + UM + Coimbra + Lisboa + Galiza e coisa e tal.
Ah! Já me esquecia, uma última ideia. A qualidade em investigação básica, por um lado, ajuda nesta composição; por outro, a excepção antes aludida no co-desenvolvimento de fármacos e em ensaios em fases clínicas e pré-clínicas; e também, por que não dizer, as inovações a nível assistencial que se estão a introduzir nalguns centros, como médicos e enfermeiros à comissão e serviços à consignação e coisa e tal.

Nós, postos a supor, imaginemos que se estendia o conceito aos centros de assistência primária e que, ademais do apoio a pacientes, que já existe, ainda que possa ser claramente melhorável, assim houvesse uma envolvente financeira mais calorosa. E que todo o pacote pudesse ser potenciado – talvez não de forma prioritária, porem podia ser com vontade estratégica. Eu sei que o senhor é Ministro da Ciência, mas que diabo também pode dar uma ajuda solidária lá ao colega da pasta. Dado o que há e o que poderia haver com um pouco mais de visão e mais qualquer coisinha de recursos, igual teria uma rede de excelência num sector de enorme transcendência social e igual impacto económico.

Pois de nada, senhor Ministro, não tem que agradecer e até porque já está pago. E se agora há que começar a preparar coisas e questões de orçamentos para as quais necessita de mais ideias, já sabe, estou à sua disposição.
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