terça-feira, 18 de setembro de 2007

Há coisas que 9 meses, não dá para nascerem.




Lembro-me bem do livro de Tom Peters, ‘Na senda da excelência’, lido em português e perdido algures numa das minhas andanças de cá para lá e de lá para cá. Aí pelas páginas noventa e tal faltavam-me uma série delas, ou seja, elas estavam por lá mas em branco. Protestei no livreiro, mas sem êxito; o livro vendia como castanhas assadas em Novembro e nunca cheguei a ter o livro do Peters com as páginas todas. Todo este intróito para dar conta que, aquilo o que Peters escreveu no início dos 80s desmentiu nos livros seguintes, passou de divulgador da I.B.M., Procter & Gamble e General Electric a porta-voz da ala esquerdista da gestão, aparecendo como um crítico radical que clamava por mudanças extremas. Tom Peters tem o seu negócio estruturado e o negócio dele é vender livros e realizar seminários. Retenho uma daquelas frases do Peters, que se reproduzem aqui e ali, excelentes para ilustrar a capa de um jornal ou até para espicaçar os leitores de um blogue: “As oportunidades, agora, estão no proveito que se tira da instabilidade – isto é criá-las a partir da turbulência diária e da agitação do mercado”.
Foi isto que praticou TP ao longo da sua vida. Escreveu, baralhou, pensou, tornou a baralhar e tornou a escrever. Vendeu, vendeu, vendeu…
No remanso da sua quinta de Vermont, Tom Peters sabe que a I.B.M. sobrevive porque continua a caminhar o seu caminho.
A Universidade de Aveiro é uma das pequenas universidades portuguesas que vai fazendo o seu percurso caminhando, entre a estrada nacional 109 e a estrada nacional 1. Raras vezes olha em direcção ao Norte, não contrariando a maioria da sua massa crítica que pende tradicionalmente para Coimbra, numa tendência pequeninha para aquela ideia das terras barrentas, que deram telha, tijolo e abobadilha, leitões e espumante da Bairrada.
Mas, esta pequena universidade, tem um trajecto ‘sui generis’ que teve de ser recordado aos mais novos durante uma pequena fervura da água branda vertida durante micro conversas em torno do RJIES. Para algumas pessoas da UA que acreditaram na possibilidade do RJIES vir a ser um vento novo - observe-se que a UA já trabalha para a grelha da AAAES há bom e sossegado tempo - algumas novidades sopradas pelo RJIES vinham a favor das velas dos moliceiros. Às vezes a UA vira de rumo (eu diria, reajusta o rumo) com base numa estratégia dirigida por um reitor (foi assim com Júlio Pedrosa), olha para o seu território, contabiliza os seus recursos, vai ao encontro das pessoas que ocupam um espaço de mercado.
Quando o RJIES versão teste apontou para a chegada de pessoas do exterior até à porta do planeamento estratégico e da administração da universidade, muito boa e má gente da UA sentiu-se em casa. Isto tem que ser dito assim, à má fila, porque desde 2006, que algum ‘espírito santo de orelha’ andava a trabalhar aquela reitoria; não cai do Céu um professor catedrático convidado que é administrador de topo da Siemens, nem cai do Céu outro professor catedrático convidado administrador de topo da Bosch-Vulcano, nem eu caí do Céu na administração do Porto de Aveiro para desenhar o plano de marketing da futura plataforma logística, nem lá chegaram a Martifer, nem a BP, em trenó puxado a renas, and so one, and so one.

Por muito que custe à malta do Eduquês, mais à malta do Ambiente, gente da Cerâmica e do Vidro e outras coisas giras mas manifestamente insuficientes para dar corpo a uma universidade capaz de o dar (ao corpo) ao manifesto, isto foi andando, piano piano, porque o CET (Centro de Estudos de Telecomunicações) uma estrutura dos CTT, encomendou formação para os seus técnicos, em 1974. Estava a U.A. de fraldas nessa altura. O curso de engenharia de telecomunicações e electrónica foi o primeiro do género à época, em Portugal. Uma área nova, que levou a U.A. a ir à Grã-Bretanha contratar doutorados provenientes das ex-colónias ultramarinas, nomeadamente moçambicanos. A busca de conhecimento chegou aos Estados Unidos, onde a U.A. conseguiu convencer mais alguns investigadores a dar o salto para a Europa, para ensinar os novos alunos.
A U.A. vai levando a água ao seu moinho porque a generalidade dos departamentos se preocupa com uma coisa que, solenemente, o Comandante e mais o Zé Mariano chamam «empregabilidade». E como? Será que os cursos estão desenhados à medida dos empregadores? Não!
A nossa gente ainda não sabe fazer nada disso. O processo de Bologna tem sido uma prensa que pode comprimir uma amálgama de disciplinas e fazer de alguns cursos uma espécie de produto de beleza 2 em 1.
Os departamentos são pequenos e os cursos admitem pouca gente: entre o curso de Física com 20 lugares e os 110 para o curso de Engenharia de Telecomunicações e Electrónica (já catalogado sob a forma de mestrado integrado…), ou os 50 de Engenharia e Gestão Industrial. A empregabilidade obviamente é negociada com as pessoas de fora. Ninguém prepara estudantes da educação superior para trabalhar e se algum dia passar isso pela cabeça dos directores dos departamentos vão, inexoravelmente, perguntar a quem sabe, isto é, a quem trabalha.
A Bosch-Vulcano e a sua estrutura de TermoTécnica fica praticamente com toda a ‘produção’ anual dos engenheiros DEGEI, isso é importantíssimo, porque permite fazer passar os jovens por uma tina, dar-lhes um banho de imersão de planeamento, métodos, tempos, logística interna, sei lá mais o quê. São engenheiros mas trabalham durante um ano nos turnos da noite, como encarregados de turno, chefes de secção, porque sabem ler especificações, gráficos, tabelas e são capazes de redigir um relatório de não conformidade com laivos de eficiência. O mínimo de que a Bosch precisa é constantemente ajustado com as pessoas que vêm ensinar à universidade e voltam periodicamente à fábrica para ganhar estatuto, carreira, trocar de carro, etc.
A seguir, toda e qualquer fornada vai ser distribuída pelas 180 empresas que, em Portugal, produzem componentes para a indústria automóvel. Desde a Auto-Europa em Palmela até à Sunviauto em Pedroso (V.N.Gaia) seguindo para a Inapal ou para a Grohe, tudo é abastecido desde o ponto de partida Bosch-Vulcano ou de outra alternativa, o grupo Simoldes, 18 empresas localizadas na aldeia industrial de Oliveira de Azeméis.
O DETI negoceia com a PT Inovação, também agora com a Nokia Siemens, a quantidade de estagiários, ou de mestrados, ou de doutoramentos e em quê, e como, e quando.

Este RJIES não formalizou ainda, por falta de coragem, o como se consegue tornar visível todo este entrosamento entre pessoal de dentro e pessoal de fora, o alinhamento (mais fácil) ou a
a interpenetração (mais difícil) das estratégias, entre entidades de educação/formação e entidades da produção, por várias razões, porque a mudança é tudo menos pacífica e porque a nossa cultura é de profunda hipocrisia.
Se tivermos dois dedos de testa até somos capazes de compreender que o RJIES não tem nada que se meter com a estratégia, a táctica ou a operacionalidade da instituição X. As universidades e os politécnicos não têm – eu diria não devem – ser todos iguais. Devem pugnar pela diferenciação e se alguma instituição quiser andar mais fora do que dentro os invejosos não são obrigados a seguir exemplos de contrários e concorrentes.
A instituição propõem ao Estado o financiamento do seu programa de trabalho para os próximos anos e dessa negociação resultam financiamentos e ‘outcomes’ da educação. É no próprio contrato que estão as cláusulas e os critérios de avaliação e de memória futura.
O próximo passo segue dentro de momentos: os grandes projectos de I&D vão ser realizados cada vez mais, fora dos tradicionais espaços universitários.
A negociação e participação do pessoal dito académico vai ter regras distintas uma vez que o Estado não tem orçamento q.b. para acompanhar as propostas e os volumes de financiamento que são exigidos.
Por especial favor, alguns grupos europeus ainda vão condescendendo com a fita que o nosso MCTES faz, a dizer que a sua participação é X em Y, mas a prática mostra-nos alemães e finlandeses a sorrir e a comentar que o investimento português vem a pé, vai chegar sim, mas a passo. Isto é tudo uma questão de tempo.

1 comentário:

Luis Moutinho disse...

subscrevo.
o que é que tenho andado a fazer? a acção passa-se toda neste blog!

diferenciação, encontrar estratégias, seguir as estratégias, trabalhar, trabalhar bem.