segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Uma Universidade é uma coisa muito séria...


Esta manhã, fiz de emigrante na cidade grande. Sentei-me a uma mesa com dimensão bastante e estive a assinar papéis. A cabeça, vaidade q.b., ainda é o que era.
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Já lá vão muitos anos. A primeira vez que fui de visita à cidade grande foi para ir receber um cheque a uma coisa que se chama Fundação Calouste Gulbenkian. Tinha 17 anos já barbados. O meu pai, à partida da estação de S. Bento, deu-me uma palmada nas costas e disse-me para ter juízo. Nem pão de trigo, nem linguiça pr’a merenda.
Revi o filme todo, do princípio ao fim, esta manhã, sentado naquela mesa:
«Levaram-me até uma pequena sala onde estava um senhor sentado, com um monte de cheques na sua frente. Sabia que eram cheques porque alguém me havia anunciado como grande momento, enorme motivação para me ter despedido da família e rumado à cidade grande. Ouviu o meu nome sem pronunciar sequer uma palavra. Foi ao monte, retirou de lá um papel meio salmonado, leu em voz alta o meu nome de família (que não é igual ao meu nome de guerra…) e estendeu-me o ‘linguado’ que significava uma montanha de escudos como eu nunca havia sonhado alguma vez, pôr-lhe a mão em cima.
Perguntou-me com um olhar de aço, que ia eu fazer da minha vida.
Disse-lhe que ia ser físico nuclear. Queria ir para a Suiça onde tinham um acelerador de partículas – o CERN tinha na altura 11 anos –
Não quero mentir, mas juro que vi um sorriso irónico a assomar na boca do homem da «massa». Deu duas voltas ao monte dos cheques e falou à guisa de despacho:
- E depois vens para cá, fazer o quê?
Com a maior seriedade (de que já não capaz), dei-lhe troco: - Então… depois venho para cá, para ser professor na universidade.
Visivelmente sem paciência para aturar putos, o homem dos cheques levantou-se e disse:
- Oh! menino. Uma universidade é uma coisa muito séria! »
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A meio dos papéis que estava hoje a assinar, senti-me vai-não-vai para deixar tudo em cima da mesa; é que a história de 1965 estava tão nítida na frente dos meus olhos que, de verdade, senti medo.

1 comentário:

J. Cadima Ribeiro disse...

Caro Alexandre Sousa,
Parabéns pelo sucesso do projecto e parabéns pelo cheque.
Não é só nas cidades grandes que se encontram "caras de pau" e gente que pouco mais sonha que poder assinar cheques gordos. Nas pequenas e nas médias também os há.
Um abraço,